Liderar a si mesmo ou ao outro?
O RH é o único que tem a licença
poética para analisar, opinar e até sugerir soluções sobre temas e áreas para
os quais não foi chamado
Marcos Nascimento*
Há algumas semanas, estive em Gramado (RS),
conduzindo um programa de desenvolvimento de lideranças para uma conceituada
escola de negócios da região Sul, cujo módulo era Liderança Educadora. O que
poderia estar contido nisso? Antes de entrar no "que" trabalhamos,
vale explicar o "como". Deliberadamente, escolhemos propor uma
discussão e reflexão por meio de 4 Ds (originalmente do inglês): describe
(descrever - em que apresentamos conceitos provenientes de um diagnóstico sobre
modelos atuais de liderança, tendências, aplicações e algumas boas práticas);
demonstrate (demonstrar - aqui, os participantes são convidados a atuar e
demonstrar o conceito na prática; do (fazer - os participantes buscam aplicar
em uma situação real do seu dia a dia o que já lhes foi demonstrado, por meio
de discussões em duplas e posteriormente em grupos; debrief (em que se analisam
as possíveis barreiras, as chances reais de dar certo, aspectos estruturais e
atitudinais que precisam ser endereçados, que tipo de ajuda precisariam para
começar, etc.).
O que trabalhamos foi a tríade de Ram Charam sobre
liderar a si, os outros e o negócio. Aqui, começa uma grande reflexão: a
dificuldade de falar sobre esse tal de "liderar a si mesmo". Enquanto
se está na esfera do "descrever", em que aspectos da neurociência e
funcionamento dos modelos mentais são abordados de forma conceitual, tudo bem.
Mas quando se entra em questões mais profundas, em que alguns
"porquês" começam a ser colocados em discussão, aí a dificuldade
aparece e, com ela, o grande culpado pelo fracasso dos executivos atuais na
execução de sua missão de liderar: "o outro", esse ser que nunca faz
o que pedimos ou mandamos. Esse é um pensamento clássico e mais presente do que
se imagina nos níveis mais altos das organizações. Só que todos nós somos
"o outro" de alguma hierarquia. Ou seja, somos o "problema"
de alguma instância de liderança. E é aí que o desenvolvimento de uma liderança
em RH pode ser um fator diferencial entre a maturidade versus a mediocridade
dos líderes.
A área de RH é a única que tem a licença poética
para entrar, analisar, opinar e até sugerir soluções sobre temas e áreas para
os quais não foi chamada. Aliás, tem a obrigação de fazer isso por ser a
guardiã de muitos dos processos que tocam o recurso mais crítico das empresas.
Mas, por favor, não caiam na armadilha de culpar "o outro" pelos
processos de liderança não funcionarem. Por favor, trabalhem o liderar "a
si mesmo" de forma profunda, ampla e objetivando o se conhecer mais e
melhor.
Não é fácil e tranquilo fazer essa jornada. Mas
quando conseguimos liderar a nós mesmos, conhecendo principalmente nossos
limites, tomando consciência do que não sabemos e começamos a verificar que
somos fracos, é justamente aí que somos fortes, pois é quando buscamos nos desenvolver
de forma efetiva e passamos a ser mais sucintos, específicos e generosos
conosco e com os que nos cercam. E como RH é cercado por toda a organização,
sua capacidade de influenciar é exponencial. Conheço áreas que atuam assim e os
resultados vão além da liderança interna, pois chegam a impactar a liderança de
mercado, da indústria, do país.
*Marcos Nascimento é partner at Manstrategy
Consulting, expert em desenvolvimento e alinhamento de top teams
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